O Antoniano

Santa Fé Católica, Santo Antônio de Lisboa, sã filosofia et alia

O sermão pregado não segue o texto abaixo ao pé da letra.

Sermão para o I Domingo da Quaresma
Pe. Marcos Vinícius Mattke, IBP
Capela Nossa Senhora das Dores
Brasília/DF, 09 de março de 2025 A.D.

Caríssimos fiéis,

Neste primeiro domingo da Santa Quaresma, Nossa Santa Romana Igreja coloca diante de nossos olhos Nosso Senhor Jesus Cristo, que após seu batismo no Jordão, foi conduzido pelo Espírito Santo ao deserto. “Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto para ser tentado pelo demônio. E depois de jejuar quarenta dias e quarenta noites, teve fome.” Contemplemos, caríssimos fiéis, este mistério profundo que contém ensinamentos essenciais para nossa vida espiritual, especialmente neste tempo penitencial no que tange ao pecado do respeito humano.

Vejamos, meus caros, que Cristo não inicia seu ministério público buscando o aplauso das multidões ou a aprovação dos poderosos. Ele não frequenta os palácios de Herodes nem as casas dos ricos. Ao contrário, recolhe-se na solidão do deserto, onde experimenta a fome, a sede, as intempéries. Por quarenta dias e quarenta noites, Ele jejua, mortifica a carne, dedica-se à oração, ensinando-nos a combater os inimigos da alma, merecendo graças para nossos combates e preparando-se para a batalha espiritual.

Este é o nosso modelo, caríssimos. Para vencer o pecado, para resistir às tentações, para fazer penitência verdadeira, não podemos permanecer no mundo, misturados com o mundo, impregnados pelo espírito do mundo. Devemos, ao menos espiritualmente, retirar-nos para o deserto, onde, no silêncio e na mortificação, podemos ouvir a voz de Deus e fortalecer nossa alma contra os ataques dos nossos inimigos.

Vejamos como o demônio se aproxima de Nosso Senhor. Ele escolhe o momento da fraqueza física, quando Cristo “teve fome”, para lançar seus ataques. E quais são as tentações que propõe? Primeiro, apela para o conforto e a satisfação imediata: “Se és Filho de Deus, ordena que estas pedras se transformem em pães.” Em seguida, tenta-O com a presunção: “Se és Filho de Deus, lança-te daqui abaixo,” confiando temerariamente na proteção divina. Por fim, oferece-Lhe todos os reinos do mundo, toda a glória terrena, em troca de um simples gesto de adoração.

E como reage Nosso Salvador? Porventura entra em diálogo com o tentador? Estabelece um compromisso? Busca um meio-termo aceitável? Absolutamente não! Em cada tentação, responde com a Palavra de Deus, com firmeza e clareza: “Nem só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”; “Não tentarás o Senhor teu Deus”; e, finalmente, com autoridade suprema: “Retira-te, Satanás! Pois está escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás e só a Ele servirás.”

Eis, caríssimos fiéis, a lição fundamental para os nossos tempos: não se dialoga com o erro, não se negocia com o mal, não se busca conciliação com o demônio. Diante da tentação, seja ela qual for, devemos ser categóricos como Cristo: “Retira-te, Satanás!”

Donde, meus caros, a necessidade de meditarmos sobre o gravíssimo pecado do respeito humano, tão comum em nossos dias e tão pernicioso para a vida espiritual, e que leva tantas almas à apostasia e ao inferno.

O que é, caríssimos, o respeito humano? É aquele pecado em que tememos mais os homens do que a Deus; em que estamos mais preocupados com o julgamento das criaturas do que com o julgamento do Criador. É a covardia espiritual que nos faz envergonhar de nossa fé, de nossas práticas religiosas, de nossos princípios morais, por receio de sermos ridicularizados, marginalizados ou perseguidos. É trocarmos a felicidade eterna por um falso conforto momentâneo.

Quantas almas se perdem por este pecado. Quantos cristãos deixam de defender a verdade, de professar publicamente sua fé, de frequentar os sacramentos, por temerem o que os outros pensarão deles. Quantos jovens católicos cedem às pressões dos falsos amigos, entregando-se à imoralidade, às drogas, à impureza, por não quererem ser considerados “esquisitos”, “extremistas”, “fascistas”, quantos não acabam por imitar os maus só para se sentirem aceitos. Quantos homens e mulheres, nas empresas, nas universidades, nos meios de comunicação, calam-se diante das blasfêmias, das heresias, dos ataques à Igreja, por medo de perderem posições ou prestígio.

E mais grave ainda, caríssimos fiéis: quantos pais e mães omitem-se na formação cristã de seus filhos, por não quererem parecer “autoritários” ou “ultrapassados”! Quantos sacerdotes deixam de pregar as verdades integrais da fé, especialmente sobre moral matrimonial, sobre os novíssimos, sobre o inferno eterno, por recearem desagradar aos fiéis ou serem tachados de “rígidos” ou “rigoristas”!

Recordemos as palavras de Nosso Senhor: “Quem se envergonhar de mim e de minhas palavras nesta geração adúltera e pecadora, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória de seu Pai com os santos anjos.” E noutra passagem: “Aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai que está nos céus.”

Meus caros conspícuos, cada vez que cedemos ao respeito humano, cada vez que, por medo dos homens, negamos Cristo com nossas palavras ou com nosso silêncio, com nossas ações ou omissões, cometemos um pecado semelhante ao de São Pedro no pátio do sumo sacerdote. E como ele, só nos resta chorar amargamente nossa traição e implorar a misericórdia divina.

O mundo moderno, caríssimos, é dominado por um espírito de falsa conciliação. Pretende-se conciliar a luz com as trevas, a verdade com o erro, o bem com o mal. Ouve-se constantemente falar em “diálogo”, “abertura”, “acolhimento”, “inclusão”, “diversidade” como se fosse possível estabelecer um compromisso entre Cristo e Belial, entre a Igreja e o mundo, entre a doutrina católica e as ideologias mundanas.

Já no século XIX, o Beato Pio IX, em seu Syllabus, condenava solenemente esta tendência conciliadora com o erro. A proposição 80 deste documento, que os modernistas tanto desprezam, afirma ser falso que “o Romano Pontífice pode e deve reconciliar-se e transigir com o progresso, com o liberalismo e com a civilização moderna.”

Esta sábia condenação, caríssimos, que parecia tão dura aos ouvidos liberais daquela época, e que parece tão “intolerante” e “radical” aos homens de hoje, mostra-nos uma verdade básica fundamentada no princípio tão básico que é o princípio de não contradição: não é possível uma conciliação entre a verdade e o erro, entre a verdadeira religião e as falsas religiões, entre a moral católica e a imoralidade do mundo.

Contudo, um século depois, assistimos a um desmantelamento do bom senso e da inteligência na sociedade em geral e até mesmo em muitos setores da Igreja. Por todo canto, até pelas autoridades mais altas, ouvimos palavras que marcam  uma nova postura, inconciliável com o exemplo de Cristo e com o ensinamento de sempre do magistério eclesiástico: a Igreja devia adaptar-se ao mundo moderno, tornar-se mais “aceitável” aos olhos dos homens contemporâneos, abandonar suas “condenações” e sua “intransigência” em favor de uma atitude mais “positiva” e “acolhedora”. Deveria haver um blasfemo encontro entre a religião do Deus que se fez homem com a religião, por que o é, do homem que se fez deus.

Desde então, caríssimos fiéis, muitos na Igreja têm procurado adaptar a doutrina católica ao espírito do mundo, suavizando seus ensinamentos, diluindo sua moral, relativizando seus dogmas, buscando uma falsa paz com a sociedade descristianizada. Em nome de um “aggiornamento” que na verdade uma corrupção, temos visto um esforço contínuo para fazer a Igreja parecer mais “moderna”, mais “relevante”, mais “atraente” para o homem contemporâneo.

Qual tem sido o resultado deste espírito de adaptação ao mundo? Porventura esta atitude conciliadora tem convertido as almas a Cristo? Tem fortalecido a fé dos católicos? Tem aumentado as vocações sacerdotais e religiosas? Tem enchido nossas igrejas? Tem promovido uma vida cristã mais intensa e fervorosa?

Não é o que se vê. Os fatos estão diante de nossos olhos: esta adaptação ao mundo tem esvaziado os seminários, tem fechado conventos, tem afastado os fiéis dos sacramentos, tem corrompido a fé de incontáveis almas. Por que esta adaptação ao mundo falha tão miseravelmente em seus pretensos objetivos? Porque, caríssimos fiéis, existe uma incompatibilidade fundamental entre o espírito de Cristo e o espírito do mundo. Como ensina Santo Tomás de Aquino, os contrários não podem coexistir no mesmo sujeito. Não se pode servir a dois senhores. O espírito do mundo é diametralmente oposto ao espírito de Cristo.

“Não ameis o mundo nem o que há no mundo,” adverte-nos São João. “Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. Porque tudo o que há no mundo – a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida – não vem do Pai, mas do mundo. E o mundo passa, e também a sua concupiscência; mas aquele que faz a vontade de Deus permanece eternamente.”

E o próprio Senhor nos previne: “Se o mundo vos odeia, sabei que antes odiou a mim. Se fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; mas porque não sois do mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso o mundo vos odeia.”

Como, então, pretender conciliar a Igreja com o mundo? Como esperar que a verdadeira religião seja aceita e aplaudida por uma sociedade que rejeita a própria existência de verdades absolutas? Como imaginar que a moral católica, baseada na lei natural e na Revelação divina, possa ser acolhida por um mundo que exalta o hedonismo, o materialismo, o relativismo?

Eis, portanto, caríssimos fiéis, por que devemos combater tão firmemente o respeito humano! Não nos importemos com os aplausos ou censuras dos homens! Temamos somente a Deus! É o que nos diz o Senhor: ”Não temais os que matam o corpo, mas não podem matar a alma; temei antes aquele que pode destruir a alma e o corpo na geena.” E noutra passagem: “Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a sua alma?”

Sigamos o exemplo de Cristo no deserto: recusai toda tentação de compromisso com o mundo, toda proposta de conciliação com o erro, toda sugestão de adaptar a fé ao espírito do tempo. Respondei ao tentador com as palavras da Escritura, com a doutrina imutável de Nossa Santa Madre Igreja, com a firmeza dos mártires e confessores da fé.

Nas famílias sejamos intransigentes na educação cristã das crianças, sem ceder à mentalidade permissiva do mundo. Ensinando as verdades da fé, o amor à virtude, o horror ao pecado. Vigiando suas leituras, seus entretenimentos, suas amizades. Introduzindo-lhes na prática da oração, do sacrifício, da mortificação adequada à sua idade.

Nos ambientes de trabalho, de estudo, de lazer, não tenhamos vergonha de professar abertamente nossa fé católica. Afastando-se das conversações impuras, de calúnias, das diversas iniquidades. Não temamos ser considerados “diferentes”, “estranhos”, “antiquados”. Melhor ser ridicularizado pelos homens do que condenado por Deus.

Em nosso apostolado, em nossas obras de misericórdia, no nosso estudo da fé, não nos deixemos seduzir pelas falsas soluções políticas, culturais, aparicionistas, pelos métodos mundanos, pelas conversas de influencers, coachs, cursos. Jamais tenhamos como parâmetro o sucesso imediato, os números impressionantes, a aprovação das massas. Busquemos a glória de Deus e a salvação das almas, custe o que custar.

Na política, na economia, na cultura, em todos os âmbitos da sociedade, Deus debe estar em primeiro lugar. Em primeiro lugar devem estar os princípios do reinado social de Cristo, sem concessões ao liberalismo, ao socialismo, ao relativismo moral. Sem temer os rótulos de rígidos, radicais, fanáticos. Estas acusações foram dirigidas ao próprio Cristo e aos apóstolos.

Enfim, caríssimos fiéis, sejamos católicos verdadeiros, católicos íntegros, católicos sem adjetivos que diminuam ou deformem nossa identidade. Não nos envergonhemos de professar a fé em sua inteireza, de praticar a moral católica em toda sua exigência, de defender os direitos de Deus e de Sua Santa Romana Igreja sem temor ou hesitação.

Lembremo-nos sempre desta verdade fundamental: “O homem é maior quando está de joelhos diante de Deus.” Quem teme a Deus não precisa temer criatura alguma. Quem busca agradar somente a Deus não precisa preocupar-se com a aprovação dos homens.

Neste tempo de Quaresma, façamos um exame sério de consciência sobre quanto está presente o respeito humano em nossa vida. Quantas vezes não defendemos a verdade por medo? Quantas vezes nos calamos diante do erro, do pecado, da blasfêmia? Quantas vezes participamos de conversações, entretenimentos, atividades moralmente questionáveis, apenas para “não sermos diferentes”?

Façamos penitência e tomemos a firme resolução de nunca mais trair a Cristo por respeito humano, de nunca mais buscar a conciliação impossível entre a Igreja e o mundo, entre Deus e o demônio.

Que a Santíssima Virgem Maria, que permaneceu firme ao pé da Cruz quando todos fugiram, nos obtenha a graça de nunca nos envergonharmos de seu Divino Filho e de Sua Igreja. Que São José, Patrono da Igreja Universal, nos conceda a coragem de defender a fé, mesmo contra os poderosos deste mundo. Que todos os Santos e Mártires, que preferiram a morte a negar a Cristo, intercedam por nós, para que sejamos fiéis até o fim.


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