ÁLBUM FOTOGRÁFICO DO DOMINGO DE RAMOS EM BRASÍLIA-DF
Pe. Marcos Vinicius Mattke, IBP
O Domingo de Ramos marca a entrada solene na Semana Santa, a semana das semanas que contém os mistérios mais sublimes de nossa Redenção. Como diria Dom Guéranger, este dia santo contém uma dualidade admirável: “a alegria, unindo-se às aclamações que ressoam na cidade de David; a tristeza, retomando logo o curso de seus gemidos sobre as dores de seu Esposo divino.” Neste dia santo, a Igreja comemora dois acontecimentos aparentemente contraditórios: o triunfo de Nosso Senhor em Sua entrada em Jerusalém e o início de Sua Paixão santíssima.
A Tríplice estrutura do Rito
A liturgia do Domingo de Ramos divide-se em três partes distintas mas organicamente unidas:
- A bênção dos ramos
- A solene procissão
- A Santa Missa com o canto da Paixão
Cada elemento desta tríplice estrutura possui um significado espiritual próprio que, juntos, formam uma preparação completa para os mistérios da Semana Santa. Como observa Dom Parsch, o drama sagrado deste dia se desenrola em três locais: o Monte das Oliveiras (para a bênção dos ramos), o caminho para Jerusalém (para a procissão), e a cidade santa (para a Santa Missa).
As três cerimônias são celebradas com paramentos de cor roxa, pois apesar do caráter triunfal da entrada de Cristo em Jerusalém dia, a Santa Romana Igreja já se encontra imersa no tempo da Paixão. O roxo, cor da penitência e do sofrimento, lembra-nos que estamos seguindo Cristo em Sua caminhada para o Calvário. Mesmo durante a bênção dos ramos e a procissão, que celebram a entrada triunfal de Cristo na cidade Santa, os paramentos roxos nos recordam que este triunfo é apenas um prelúdio para o grande drama da Redenção que se desenrolará nos próximos dias.
Primeira parte: a bênção dos ramos
A liturgia começa de maneira triunfal, anunciando a realeza de Cristo. A antífona de entrada, que serve como um Introito para esta primeira parte, proclama: Hosanna ao Filho de David! Bendito seja aquele que vem em nome do Senhor. Ó Rei de Israel! Hosanna nas alturas!”
A bênção dos ramos é estruturada de maneira semelhante à Santa Missa, com Oração, Epístola, Gradual, Evangelho e Prefácio, mas sem Ofertório, Consagração ou Comunhão. Como observa o Cardeal Schuster, “a bênção dos ramos conserva para nós o antigo tipo das reuniões alitúrgicas, isto é, das reuniões realizadas para a recitação do ofício divino, a instrução dos fiéis, etc., sem a oferta do santo Sacrifício.”
O sacerdote começa com uma oração que já antecipa os grandes mistérios da semana maior: “Ó Deus que nos devemos amar para ser justos, multiplicai em nós os dons de vossa graça inefável: pela morte de vosso Filho, vós nos destes direito de esperar o que é objeto de nossa fé; fazei-nos chegar, por sua ressurreição, ao termo para o qual aspiramos.”
Na leitura da Epístola, tirada do livro do Êxodo (Ex. XV, ,27; XVI, 1-7), somos transportados ao deserto, onde os filhos de Israel, após a saída do Egito, acamparam sob 70 palmeiras em Elim. Ali encontraram doze fontes, que prefiguram os doze apóstolos, de quem emana a água da doutrina salvadora. Como observa Dom Guéranger, “todas estas figuras se cumprem no povo cristão. Por uma sincera conversão, os fiéis romperam com o Egito que representa o mundo.” As doze fontes figuram o Batismo que será conferido aos catecúmenos, e o maná do céu prefigura Jesus, Pão da Vida, que ressuscitará no Domingo de Páscoa.
Após a Epístola, canta-se um dos dois responsórios, que já nos conduzem ao drama da Paixão. O primeiro, tirado de São João (XI, 47-53), recorda a decisão tomada no sinédrio, sob a presidência de Caifás, de condenar Jesus à morte: “É melhor que um só homem morra pelo povo, que pereça toda a nação.” O segundo, tirado de São Mateus (XXVI, 39-41), lembra-nos a agonia de Jesus no Jardim das Oliveiras: “Pai, se é possível, afasta de mim este cálice. Contudo, não se faça a minha, mas a tua vontade.”
O Evangelho desta primeira parte, tirado de São Mateus (XXI, 1-9), nos relata a entrada triunfal de Cristo em Jerusalém. Este evento fora anunciado pelo profeta Zacarias: “Exulta de alegria, filha de Sião, rejubila, filha de Jerusalém: eis que o teu rei vem a ti; ele é justo e vitorioso, humilde, montado sobre um jumento, sobre um jumentinho, filho de uma jumenta” (Zc. IX, 9). Como explica Dom Guéranger, a jumenta e o jumentinho têm um significado simbólico: “A jumenta representa o povo judeu, que há muito estava sob o jugo da Lei; o jumentinho, sobre o qual, diz o Evangelho, nenhum homem havia montado ainda, representa a gentilidade, que ninguém havia domado até então.” Jesus monta sobre o jumentinho, prefigurando como os gentios tomariam o lugar do povo judeu na Nova Aliança.
Após o Evangelho, seguem-se as orações solenes de bênção dos ramos. Segundo o costume romano, antes da anáfora consecratória dos ramos, há uma oração semelhante à secreta da missa: “Aumentai, ó Deus, a fé daqueles que esperam em vós, e atendei propício às súplicas dos que vos imploram. Que a vossa misericórdia desça abundantemente sobre nós; sejam igualmente benzidos estes ramos de palmeira e de oliveira; e assim como, para prefigurar a Igreja, concedestes uma descendência numerosa a Noé, ao sair da arca, e a Moisés, ao sair do Egito com os filhos de Israel, que também nós, levando em nossas mãos palmas e ramos de oliveira, possamos, por meio de uma vida santa, ir ao encontro de Cristo, e que, pelos seus méritos, sejamos dignos de entrar na alegria eterna.”
O sacerdote entoa então o Prefácio, no qual a Santa Igreja glorifica a Deus, reconhecendo que “todas as criaturas vos obedecem; não só toda coisa criada proclama o vosso louvor, mas também os vossos santos vos bendizem de maneira especial quando confessam livremente diante dos reis e potestades deste mundo o grande nome de vosso Filho único”. Este Prefácio, profundamente anti-ariano, afirma a doutrina católica da consubstancialidade do Filho com o Pai, verdade que será reafirmada na Epístola da Missa.
Após o Sanctus, seguem-se seis belíssimas orações, muito antigas, que explicam o simbolismo dos ramos e invocam a proteção divina sobre aqueles que os levarem consigo. Na primeira delas, pede-se: “Abençoai, nós vos pedimos, Senhor, estes ramos de palmeira e de oliveira, e fazei que o que vosso povo hoje executa corporalmente para vossa honra, o realize espiritualmente com a maior devoção, alcançando a vitória sobre o inimigo e amando ardentemente a obra de misericórdia.”
O padre asperge então os ramos com água benta e os incensa, completando assim sua benção. Como explica Dom Guéranger, “esses ramos de árvores, objeto da primeira parte da função, recebem, por essas orações acompanhadas do incenso e da aspersão da água santa, uma virtude que as eleva à ordem sobrenatural e as torna próprias a ajudar na santificação de nossas almas e na proteção de nossos corpos e de nossas moradas.”
Segunda parte: a procissão solene
Após a distribuição dos ramos aos fiéis, começa a segunda parte da liturgia: a solene procissão. Como observa Dom Guéranger, “ela tem por objeto representar a marcha do Salvador para Jerusalém e sua entrada nesta cidade.” Ela é o início da paixão e do calvário, donde os paramentos roxos próprio do tempo da paixão. O diácono, voltando-se para o povo, anuncia: “procedamus in pace”, ao que o coro responde: “in nomine Christi. Amen”.
Durante a procissão, cantam-se várias antífonas que evocam a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Entre elas: “Os filhos dos hebreus, levando ramos de oliveira, foram ao encontro do Senhor, clamando e dizendo: Hosanna nas alturas!” e “Os filhos dos hebreus estendiam suas vestes pelo caminho e clamavam, dizendo: Hosanna ao Filho de David; bendito o que vem em nome do Senhor!”
Como explica Dom Guéranger, “entre os judeus, ter nas mãos ramos de árvores era sinal de alegria; e a lei divina sancionava para eles este uso.” No livro do Levítico, Deus ordenara para a festa dos Tabernáculos: “No primeiro dia da festa, tereis em vossas mãos frutos dos mais belos árvores; levareis ramos de palmeira, ramos cobertos de folhas… e vos alegrareis na presença do Senhor vosso Deus” (Lv. XXIII, 40). Assim, ao levarmos ramos nas mãos, não apenas comemoramos a entrada de Jesus em Jerusalém, mas também proclamamos nossa alegria pela salvação que Ele nos trouxe.
Um momento importante da cerimônia ocorre quando a procissão retorna à igreja e encontra as portas fechadas. Como explica Dom Guéranger, “esta cena misteriosa tem por objetivo retraçar a entrada do Salvador em uma outra Jerusalém, da qual a terrestre era apenas figura. Esta Jerusalém é a pátria celeste da qual Jesus nos proporcionou a entrada. O pecado do primeiro homem havia fechado suas portas; mas Jesus, o Rei da glória, as reabriu pela virtude de sua Cruz.”
As portas fechadas representam o Paraíso, fechado pelo pecado original. O subdiácono bate três vezes na porta com o pé da cruz, simbolizando como Cristo, por Sua Cruz, reconquistou para nós o acesso ao céu. Durante este momento solene, canta-se o belo hino “Gloria, laus et honor”, composto pelo bispo Teodulfo de Orleans enquanto estava preso em Angers, por ordem de Luís, o Piedoso, no início do século IX. A Santa Romana Igreja, adotando as seis primeiras estrofes deste poema, tornou-o célebre em todo o mundo. Este hino é cantado alternadamente: os cantores dentro da igreja entoam a primeira estrofe, e o coro do lado de fora responde com o refrão. Este canto alternado simboliza o diálogo entre a Igreja triunfante no céu e a Igreja militante na terra, unidas no louvor a Cristo.
Quando as portas finalmente se abrem, a procissão entra na igreja cantando o responsório “Ingrediente Domino” (“Ao entrar o Senhor na cidade santa, os filhos dos hebreus, prenunciando a ressurreição da vida, com ramos de palmeira, clamavam: Hosanna nas alturas. Quando o povo ouviu que Jesus vinha a Jerusalém, saíram ao seu encontro com ramos de palmeira, clamando: Hosanna nas alturas”). Este canto já alude à ressurreição, mostrando que a Igreja nunca separa a Cruz da glória pascal.
Terceira Parte: A Santa Missa e o canto da Paixão
Ao entrar na igreja, deixamos para trás os cânticos de alegria e iniciamos imediatamente a Santa Missa da Paixão. A transição é abrupta e chocante, recordando-nos que o mesmo povo que aclamou Cristo com hosannas no domingo, gritaria “Crucifica-O!” na sexta-feira.
Em Roma, a estação era originalmente na Basílica de São João de Latrão, a catedral do Papa, “Mãe e Cabeça de todas as igrejas.” Como explica o Cardinal Schuster, “era de regra, na Idade Média, que as grandes cerimônias da semana pascal se celebrassem junto à residência pontifícia, no palácio dos Laterani.” Mais tarde, a estação passou para a Basílica de São Pedro, mas isso não prejudica os direitos da arquibasílica lateranense, que conserva as indulgências concedidas àqueles que a visitam neste dia.
O Introito da Missa, tirado do Salmo XXI, já nos coloca no meio da Paixão: “Senhor, não afasteis de mim o vosso socorro; atendei à minha defesa. Livrai-me da boca do leão e salvai a minha fraqueza das pontas dos unicórnios.” Como observa o Cardinal Schuster, este salmo “representa o paroxismo da Paixão: o abandono do Senhor na Cruz.” Ao recitá-lo, somos transportados em espírito ao Gólgota, onde Jesus, em seu abandono extremo, iniciou este mesmo salmo: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?”
A Coleta da Missa pede a graça de imitar a humildade de Cristo: “Ó Deus onipotente e eterno, que, para dar ao gênero humano um exemplo de humildade, fizestes o nosso Salvador encarnar-se e sofrer o suplício da cruz, concedei-nos a graça de aproveitarmos os ensinamentos de Sua paciência e de participarmos da Sua ressurreição.” Esta oração, de uma delicadeza de composição, explica o significado profundo desta semana: Jesus crucificado é como um livro, no qual a alma lê tudo o que Deus deseja dela para torná-la santa.
A Epístola, tirada da carta de São Paulo aos Filipenses (2,5-11), é um profundo hino cristológico que contrasta a majestade divina de Cristo com Sua humilhação voluntária. São Paulo descreve o mistério da κένωσις, o “aniquilamento” do Verbo, que, sendo Deus, assumiu a condição de servo e se humilhou até a morte de cruz. Mas este abaixamento é seguido imediatamente pela exaltação: “Por isso, Deus o exaltou soberanamente e lhe deu o Nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus todo joelho se dobre no céu, na terra e nos infernos, e toda língua confesse, para glória de Deus Pai, que Jesus Cristo é o Senhor.”
Durante a leitura desta Epístola, há um momento solene: quando o subdiácono pronuncia as palavras “para que ao nome de Jesus todo joelho se dobre”, todos os fiéis se ajoelham. Como explica Dom Guéranger, “a santa Igreja nos prescreve dobrar o joelho no momento desta Epístola em que o Apóstolo diz que todo joelho deve se dobrar quando o nome de Jesus é pronunciado. Compreendamos que, se há uma época no ano em que o Filho de Deus tenha direito a nossas mais profundas adorações, é sobretudo nesta Semana, em que sua divina majestade é violada.”
O Gradual, tirado do Salmo LXXII, preludia já o triunfo do próximo domingo: “Por pouco meus pés não vacilaram, pois me irritei contra os pecadores, vendo a paz dos ímpios. Tu, porém, Senhor, me tomaste pela mão, me conduziste segundo a tua vontade, e me recebeste com glória.” Como explica o Cardinal Schuster, “a mão do Todo-Poderoso sempre guiou seu Filho único; ela o conduziu pelo caminho da vida e o coroou na glória triunfal de sua ressurreição e de sua ascensão ao céu.”
O Tracto, ou salmo in directum, é o Salmo XXI em sua íntegra, onde se descrevem a agonia dilacerante de Cristo e seus sentimentos de humildade, desolação interior e confiante abandono em Deus. Este salmo, como observa Dom Parsch, é “diretamente messiânico, quer dizer, trata no sentido literal da Paixão de Cristo.” Nele encontramos profecias literais que se cumpriram exatamente no Calvário: “Traspassaram minhas mãos e meus pés, posso contar todos os meus ossos. Repartiram entre si as minhas vestes, e sobre a minha túnica lançaram sortes.”
O momento mais solene da Missa é, sem dúvida, o canto da Paixão segundo São Mateus. Como explica Dom Guéranger, desde o século VI, “a Igreja adotou um recitativo particular para esta narração do Santo Evangelho, que se torna assim um verdadeiro drama.” Três diáconos participam deste canto: um assume o papel do Cronista, narrando os fatos em tom sereno e inabalável; outro representa Cristo, cujas palavras têm um acento grave, de uma autoridade nobre e doce; o terceiro assume as falas estridentes, patéticas e confusas de todos os outros interlocutores e dos clamores pérfidos da população judaica.
Durante o canto da Paixão, todos os assistentes devem segurar seus ramos nas mãos, “a fim de protestarem, por este emblema de triunfo, contra as humilhações de que o Redentor é objeto por parte de seus inimigos.” Como explica Dom Guéranger, “é no momento em que, em seu amor por nós, ele se deixa pisotear pelos pés dos pecadores, que devemos proclamá-lo mais alto nosso Deus e nosso soberano Rei.” Após a narrativa da morte de Cristo, há uma pausa solene: todos se ajoelham e permanecem em silêncio por um momento, para honrar, por um ato solene de luto, a morte do Salvador dos homens.
Para que a Missa não fique privada de um rito essencial, que consiste na leitura solene do Evangelho, o diácono reserva uma última parte da narrativa. Ele se aproxima do altar, faz benzer o incenso pelo celebrante e recebe a bênção. Dirigindo-se ao norte, acompanhado somente do turiferário (pois os acólitos não levam seus candelabros, em sinal de luto), incensa o livro e termina a narração evangélica.
O Ofertório, também extraído do Salmo LXVIII, continua a expressar os sofrimentos do Messias: “Meu coração esperou o opróbrio e a miséria; esperei alguém que se compadecesse de mim, mas não houve ninguém; busquei quem me consolasse, mas não encontrei. Deram-me fel por alimento e, em minha sede, deram-me vinagre para beber.” Como observa o Cardinal Schuster, “assim foi tratado aquele que se prepara para nos dar seu corpo como alimento e seu sangue como bebida.”
A Secreta pede a Deus o duplo fruto da Paixão de Cristo: “Concedei, Senhor, que o dom oferecido aos olhos de vossa majestade nos obtenha a graça de uma piedosa devoção e nos faça gozar da bem-aventurança eterna.”
Na Antífona da Comunhão, a Igreja recorda as palavras de Jesus no Jardim das Oliveiras (Mt. XXVI, 42): “Pai, se não é possível que este cálice passe sem que eu o beba, faça-se a tua vontade.” Como explica o Cardinal Schuster, “quando, durante o canto destas palavras, os fiéis se aproximavam para beber realmente no cálice sustentado pelo diácono o sangue de Cristo, eles compreendiam perfeitamente que o fato de comungar nos torna solidários da Paixão.”
A Oração depois da Comunhão conclui as súplicas do Sacrifício, “implorando a remissão dos pecados para todos os seus filhos e o cumprimento do desejo que eles têm de participar da ressurreição gloriosa do Homem-Deus.”
O sentido espiritual da liturgia
O Domingo de Ramos nos ensina várias lições espirituais importantes:
Primeiro, ele nos mostra a inconstância da glória humana. O mesmo povo que aclamou Cristo como Rei no domingo, pediu Sua crucifixão na sexta-feira. Isto nos adverte contra a tentação de buscar o aplauso do mundo, que é passageiro e enganador.
Segundo, ele nos ensina o verdadeiro significado da realeza de Cristo. Como observa Dom Parsch, “Cristo entra na cidade santa montado num jumento, para simbolizar o caráter doce e benigno de sua primeira aparição messiânica. Ele não quer amedrontar com relâmpagos e trovões, mas deseja ardentemente atrair todos os homens ao seu Coração pela doçura de seus atrativos.”
Terceiro, ele nos prepara para entrar no grande mistério da Semana Santa. Os ramos que levamos para casa e colocamos junto a um crucifixo ou a uma imagem sagrada são um lembrete contínuo de nosso compromisso de seguir Cristo até o Calvário. Como explica Dom Guéranger, “os fiéis devem portar respeitosamente estes ramos em suas mãos durante a procissão e durante a Missa, enquanto se canta a Paixão, e colocá-los com honra em suas casas, como um sinal de sua fé e uma esperança no socorro divino.”
Finalmente, este dia nos recorda que a Paixão e a Ressurreição formam um único mistério. A Igreja, em sua sabedoria, não nos permite separar a Cruz da vitória. Desde o início, mesmo em meio aos sofrimentos de Cristo, ela nos faz vislumbrar a luz da Ressurreição. Como observa Dom Parsch, “a liturgia destes dias não separa a lembrança da paixão do Salvador daquela dos triunfos de sua ressurreição.”
Este domingo, além de seu nome litúrgico e popular de Domingo de Ramos ou das Palmas, é chamado também de Domingo de Hosanna, por causa do grito de triunfo com que os judeus saudaram a chegada de Jesus. Outrora foi também chamado de Domingo de Páscoa Florida, porque a Páscoa, que está a apenas oito dias de distância, está hoje como que florescendo, e os fiéis podem cumprir desde já o dever da comunhão anual. Foi em lembrança desta denominação que os espanhóis, tendo descoberto, no Domingo de Ramos de 1513, a vasta região que avizinha o México, deram-lhe o nome de Flórida.
Encontramos este domingo chamado também de Capitilavium, isto é, lava-cabeça, porque, nos séculos da média antiguidade, quando se adiava para o Sábado Santo o batismo das crianças nascidas nos meses precedentes, os pais lavavam hoje a cabeça dessas crianças, a fim de que no sábado seguinte se pudesse fazer com decoro a unção do Santo Crisma. Em uma época mais recuada, este domingo, em certas Igrejas, era chamado de Páscoa dos Competentes. Chamavam-se Competentes os catecúmenos admitidos ao batismo. Eles se reuniam neste dia na igreja, e se lhes fazia uma explicação particular do Símbolo que haviam recebido no escrutínio precedente.
A perda de um tesouro litúrgico
Ao contemplarmos a riqueza da liturgia tradicional do Domingo de Ramos, não podemos deixar de notar, com profunda tristeza, como este tesouro espiritual foi sendo progressivamente empobrecido pelas reformas litúrgicas.
A primeira grande ruptura ocorreu com a reforma da Semana Santa decretada por Pio XII em 1955. Nesta reforma, a estrutura da cerimônia do Domingo de Ramos foi consideravelmente alterada. A primeira parte, que retomava a estrutura da Missa, com seu Introito, Coleta, Epístola, Gradual, Evangelho e Prefácio, foi drasticamente simplificada. As seis belíssimas orações de bênção foram reduzidas a uma única, muito mais breve. O rito das portas fechadas, com seu profundo simbolismo da entrada no céu, foi abolido.
Mas foi com a reforma litúrgica de 1969, após o Concílio Vaticano II, que o empobrecimento atingiu seu ápice, com simplificações ainda mais radicais e adoção ainda mais pungente de um caráter catequético em detrimento do culto. O que se perdeu nestas reformas não foi apenas um conjunto de ritos externos, mas todo uma forma de expressão pela lex orandi da lex credendi católica que, ao longo dos séculos, pela condução do Espírito Santo, formou a oração do Corpo Místico de Cristo.
O Rito Romano Tradicional foi um dos principais fatores de evangelização na história da Igreja. Ele conduz os ministro e fiéis, pela suavidade do culto e com a firmeza da doutrina, através dos mistérios da fé; e isso sem se dobrar a subjetividade sentimental mas mantendo sempre os olhos em Cristo, sua doutrina e o caminho para adorá-lo e a ele converter-se. Mesmo os iletrados, que não podiam ler as Escrituras, podiam “ler” a liturgia e, através dela, penetrar nos mistérios de Cristo.
Quando este patrimônio é empobrecido, toda a vida espiritual da Igreja sofre. Os fiéis perdem o sentido do sagrado, a compreensão dos mistérios da fé torna-se superficial e dúbia, e a própria identidade católica se enfraquece.
Para a propagação e defesa da fé católica, é essencial que o Rito Romano Tradicional seja resgatado, difundido e restabelecido em seu lugar de direito como o devido Culto da Santa Romana Igreja. Não se trata de um mero retorno ao passado por motivos nostálgicos, mas do restabelecimento do culto católico e da verdade católica. Essa liturgia formada ao longo de séculos sob a ação do Espírito Santo, contém um tesouro de valores espirituais, doutrinais e pastorais que são absolutamente necessárias para a vida da Igreja.
Conclusão
O Domingo de Ramos, com sua admirável liturgia, é uma síntese perfeita de toda a Semana Santa. Nele vemos o contraste entre o triunfo e o sofrimento, entre a aclamação e a rejeição, entre a vida e a morte.
Como explica Dom Guéranger, tal é, em meio ao luto da Semana das dores, o glorioso mistério deste dia. Nossa Santa Madre Igreja quer que nossos corações se aliviem por um momento de alegria, e que Jesus hoje seja saudado por nós como nosso Rei. Logo, porém, retornaremos ao curso de nossos gemidos sobre as dores de nosso divino Esposo.
Ao entrarmos na Semana Maior, tenhamos conosco os ramos benditos, não apenas como objetos de devoção, mas como sinais visíveis de nosso compromisso de seguir Cristo, nosso Rei e Salvador, até a Cruz e, além dela, até a glória da Ressurreição. Como nos ensina Dom Parsch, “ser mártir significa render testemunho a Cristo em nossas obras e em nossa vida, pela palavra e pela profissão de fé, ainda que nos custe a perda de nossos bens, a perda de nossa vida…”
Que a liturgia deste dia santo nos ajude a compreender mais profundamente o mistério de nossa Redenção e a viver mais intensamente o amor e a fidelidade a Cristo, especialmente durante os dias solenes que se seguem. Como escreveu o célebre himnógrafo Cosme de Jerusalém: “Livra-te à alegria, ó Sião! O Cristo teu Deus reina para sempre. Ele é doce, e vem para salvar, como está escrito dele; ele é o justo, nosso redentor que avança montado sobre o filhote da jumenta.”
FONTES:
INTROIBO.FR. Commentaires liturgiques du Dimanche des Rameaux.
Dom Guéranger, l’Année Liturgique
Bhx Cardinal Schuster, Liber Sacramentorum
Dom Pius Parsch, le Guide dans l’année liturgique

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